No último sábado, enquanto fazia uma dessas leituras diletantes, descompromissadas, deparei-me com uma poesia de Charles Bukowski, ou, Hank, ou, o “velho safado”, do qual já li algumas coisas, que parece adequada para este momento. A escrita de Bukowski, nascido na Alemanha em 1920, mas criado desde os 3 anos nos EUA e falecido em 1994, é considerada maldita, normalmente autobiográfica, e fala quase sempre de álcool, bares, sexo, drogas, brigas e prostitutas. Entretanto, em muitos momentos nela se pode notar grande profundidade e relação com a realidade social. O poema “Nascido em meio a isso” é um exemplo. Trago, porém, ao conhecimento e reflexão dos leitores, outro que me parece fundamental. Chama-se “Poema para Dante” e diz assim:
“Dante, bebê, o inferno é aqui, agora.
Eu queria que você pudesse ver, por certo tempo tivemos o poder de explodir a terra, e agora estamos descobrindo o poder de abandoná-la.
Mas a maioria terá de ficar e morrer.
Ou pela bomba, ou pelo refugo de ossos empilhados e outros recipientes vazios, e merda, e vidro e fumaça, Dante, bebê, o inferno é aqui agora.
E as pessoas ainda contemplam rosas, pedalam de bicicleta, batem relógio de ponto, compram casas, pinturas e carros;
As pessoas continuam a copular em todos os lugares, e os jovens olham em volta e gritam que este deveria ser um lugar melhor, como sempre fizeram, e aí ficaram velhos e entraram no mesmo jogo sujo.
Só que agora todos os jogos sujos dos séculos se somaram a um placar que parece impossível de reverter – alguns ainda tentam, nós os chamamos de santos, poetas, loucos, tolos.
Dante, bebê, Dante, bebê, você devia ver a gente agora.”
Sim, Bukowski tinha razão. A impressão claríssima nos dias de hoje é mesmo de que, enquanto a vida corre, se juntaram todas as sujeiras, de lado a lado, de cima a baixo, de canto a canto, para reconcertar a vida sob parâmetros que nos são desconhecidos, mas que farão o Inferno de Dante parecer campo de jogos infantis como disse o Bukowski no poema primeiro referido. Tinha Dante uma régua moral para alocar pecadores em cada um dos círculos do Inferno. De não-cristãos a traidores da nação, todos tinham um lugar assegurado. Hoje não é disto que se trata. A moral foi jogada na lama, a honra foi espezinhada por aqueles que deveriam guardá-la, a nacionalidade foi transformada em discurso de gente atrasada.
Enquanto os donos do mundo se reúnem para nos alarmar e dizer que após o Great Reset tudo vai ser diferente, e a ONU se entrega à tarefa de impulsionar a agenda globalista até 2030 com o apoio e predominância de “democracias” relativas, suficientemente frágeis ao ponto de abaixarem suas bandeiras nacionais e submeterem seus habitantes à censura a ao arbítrio, os únicos que ainda lutam são os mesmos – santos, poetas, loucos e tolos. Quem fará um poema que termine com: “Velho safado, bebê, você devia ver a gente agora”?
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