Outro dia recebi de um amigo uma provocação. Perguntou-me: por que você não trata da política local em sua coluna no ac24horas? A pergunta, percebi, continha uma certa ironia, quase uma sugestão de que eu não ousava criticar ou defender lados, ou partidos, ou candidatos aos cargos em disputa.
Ora, sabendo os mais antigos que durante vários anos ocupei funções públicas e assessorei políticos locais, parece uma prática sonsa, abordar semanalmente temas políticos, sem, jamais, tocar no palco e nas personagens da nossa aldeia. Tem um tanto de razão o meu amigo em sua desconfiança. Então, mesmo sabendo que no próprio ac24horas falam de política diariamente os maiores cronistas da área, arrisco fazer aqui uma breve análise que, talvez, contente-o e aos demais leitores. Ou, não.
Começo pela frase acima, que segundo o grande jornalista Augusto Nunes (AQUI), foi pronunciada por Tancredo Neves às vésperas do confronto que teve, e ganhou, com Paulo Maluf na eleição indireta que encerraria o regime militar. Era a sucessão do General João Figueiredo em 1985.
A frase denota o gênio político daquele que desde os anos 40 freqüentou a cena principal da política brasileira. É estratégia pura, fazendo lembrar algumas das lições de Sun Tzu no famosíssimo “A Arte da Guerra” que, escrito há 25 séculos, inspirou os mais gabaritados generais e comandantes militares, entre eles Napoleão Bonaparte, sendo até hoje fartamente utilizado, inclusive entre políticos e marqueteiros.
Há na frase de Tancredo, um evidente sentido suntzuniano de conhecimento das próprias forças e das do adversário, como recomendou o sábio chinês. Além disso, tem aí a confissão de que havia atuado para que fosse aquele o seu opositor e não outro, ou seja, de algum modo, ele teria agido para a escolha de Maluf como candidato do PDS. Sabia que contra ele poderia contar com maior número de dissidentes no partido adversário, fazendo assim o número necessário à vitória no colégio eleitoral.
Com a vitoria de Maluf sobre Mario Andreazza, líderes como Marco Maciel, Aureliano Chaves, ACM e outros se bandearam para o lado de Tancredo, que ganhou com folga.
Escolher o adversário é, ao meu ver, o centro da trama atual dos reais donos do poder no Brasil. Movendo-se em um vale sombrio que o GPS do cidadão comum não costuma localizar, situado em lugar incerto entre a Justiça, a Indústria, a Mídia e a Banca, estão há meses, ou anos, em confabulação, reunindo forças e preparando o momento certo para apresentar o seu comandante e o seu exército, mas só querem fazê-lo quando tiverem escolhido o seu adversário. Dão noticia do Sergio Moro?
Como, porém, essa gente escolheria o opositor? Aí estão colocados o Lula, em processo paulatino, mas cuidadoso, de restauração moral pela Justiça, e o Bolsonaro, teimoso em afirmar-se sobre uma base conservadora cada vez mais firme como se viu no dia 7 de setembro. Um já tem o outro como adversário.
Aquela gente NEM Lula NEM Bolsonaro, porém, só pode subir ao palco como protagonista, retirando pelo menos um dos dois do cenário, forçando uma espécie de todos contra um. Os aliados, à esquerda ou à direita, virão de qualquer modo, ou, pelo beiço, como se diz no nordeste.
Creio que para eles a forma ideal é desabilitar, inviabilizar o Bolsonaro, seja via TSE, STF ou pelo próprio parlamento. É a preferida, porque o Lula seria muito mais facilmente abatido durante a campanha. Seu passado podre, seus crimes e do seu partido voltariam a freqüentar os lares brasileiros com a mesma força com que a peste chinesa invadiu o noticiário, então, para a esquerda limpinha e a direita de punhos de renda, manter Lula candidato para nocauteá-lo na campanha seria como chutar cachorro morto. Sei, tem as “pesquisas”, mas este não é um texto de humor.
A outra hipótese, a de retirar o Lula do páreo (basta o STF decidir) para enfrentar Bolsonaro, embora mais fácil, exigirá muito mais esforço na arena. Neste caso, o embate será duro e contra um presidente em exercício. A fúria acusatória de seus opositores (vide CPI no Senado) até aqui nada produziu além de fumaça e nojo de seus membros, não tem credibilidade, seus arroubos são manjados.
Ao que tudo indica, em 2022 a realidade mostrará uma economia em recuperação, de performance no mínimo equiparável à de outras nações, sem acusações críveis de corrupção e sem grandes pecados além dos excessos retóricos de seu líder. Estará em curso um governo limpo e de muitas obras a serem mostradas, que conta com o apoio de um conservadorismo renitente, consolidado na sociedade. Além disso, confrontar Bolsonaro significará cair compulsoriamente (no segundo turno, se houver) nos braços do lulopetismo e todas as suas mazelas. Mesmo um candidato ao centro não terá vida fácil quando aparecer encharcado de vermelho.
No Acre, pesquisem ou lembrem, quem usou e abusou da capacidade de escolher os adversários foi a FPA sob o comando de Jorge Viana e seus estrategistas. Nem vou citar muitos nomes para não ferir suscetibilidades, mas, lembram do Mastrângelo? As candidaturas majoritárias permitem essa estratégia. Se determinada força política consegue, sutilmente, mover ou derrubar no campo de luta as peças corretas, estará, como Tancredo Neves, escolhendo o adversário antes que a batalha se inicie.
Penso que por aqui também estamos neste momento tancrediano. Há mais movimento na coxia do que no palco. Há Malufs por aí? Pronto, amigo, falei.
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