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Excelências, uma perguntinha: Para onde vamos?

Há um provérbio oriental bastante conhecido que diz: “Se quer plantar para poucos dias, plante flores. Se quer plantar por muitos anos, plante uma árvore. Se quer plantar para a eternidade, plante ideias”. Esmiuçando, ou melhor, trazendo para o setor público, vale dizer que as “flores” são obras efêmeras, não mudam a realidade, são de curtíssimo prazo. Plantar “árvores” corresponde a ter planos de longo prazo, haverá um momento adiante para a colheita, enquanto “plantar ideias” contém algo de metafísico, não representa apenas a perspectiva de um plano, embora possa sustentá-lo como visão de mundo.


Gosto do provérbio, ele faz todo sentido, especialmente para quem lida com planos e projetos e valoriza uma gestão que tenha conceitos claros, balizas conhecidas, rumo certo e resultados definidos. A coisa pública é uma nave que precisa ser reconhecida de pronto, dela exige-se destino seguro, não pode ser um ente errático no tempo e no espaço. Melhor seria seguir um roteiro equivocado, pois sempre haveria, lá na frente, uma chance de realinhamento.


Trato disso novamente, depois de acompanhar desde fevereiro o webinário “Diálogos Amazônicos” promovido pela Fundação Getúlio Vargas - FGV. Os episódios estão todos disponíveis na web e recomendo vivamente que os assistam AQUI. No mínimo, entenderão que aquilo já dito algumas vezes nesta coluna, não é voz isolada. Em toda a Amazônia grita uma pergunta: Para onde vamos?


Quando participo de debates sobre o futuro do Acre ou da Amazônia, costumo dizer que o interesse internacional, a cobiça, as pretensões estrangeiras ou qualquer que o valha é menos ameaçador que a nossa própria incompetência em lidar com a região, em achar boas respostas para perguntas que não calam porque não tiveram respostas adequadas ao longo de décadas. O Brasil não teria por que temer investidas de internacionalização da Amazônia, a qualquer título, se tivéssemos consolidado um plano de desenvolvimento que resultasse em geração de empregos, aumento da renda do seu povo, redução da pobreza e melhoria significativa de seus indicadores sociais.


Segundo publicação recente (ver AQUI), a cobertura de água e esgotamento sanitário da Região Norte são as mais baixas do Brasil. Apenas 57,1% de toda população nortista apresenta acesso à água, 10,5% tem coleta de esgoto e apenas 21,7% dos esgotos são tratados. Fora tudo isso, as perdas de água chegam a 55,5%. No Acre, os respectivos números são piores que a média regional - 47,1%; 10,1% e 18,8%. Este foi o legado datado de 2019.


No que tange à pobreza, o cartograma abaixo, fornecido pelo SIS - IBGE é autoexplicativo. Quanto mais forte o azul, pior a condição. Vejam que o Acre está na pior faixa nas duas situações. Sim, como todos sabem, especialmente os políticos por ela responsáveis e seus teóricos, apesar dos esforços (gastos) imensuráveis que exibiam o Acre como referência, o resultado foi pífio, logo, o modelo não pode ser repetido. É claro que hoje, verificado o fracasso, é fácil apontar o dedo para as rachaduras no edifício, difícil é propor algo que funcione, que retire a Amazônia deste atraso incompatível com a sustentabilidade do desenvolvimento. Outros indicadores não expostos aqui, como desigualdade, desemprego, violência, criminalidade e muitos outros seguem o mesmo diapasão.



Uma questão que se apresenta é: De que forma o povo de uma região com tais indicadores pode ser conservacionista como requer o consenso global, sem que cada um deles – os indicadores, seja radicalmente melhorado? Deixa, essa eu mesmo respondo. NÃO PODE. Lembro, aliás, que para driblar o problema, já houve quem quisesse alterar os indicadores sociais e econômicos aplicados à Amazônia, pois seriam demasiado frios e inadequados à nossa realidade. Os “gênios” propuseram um indicador de “felicidade”, quem sabe, o sujeito era feliz na M* e as estatísticas não percebiam. Felizmente, antes de ser adotada, a ideia foi abandonada em algum monturo.


Parece claro que enquanto o Brasil não voltar a face para a Amazônia e enxergá-la em sua plenitude, dotando-a de investimentos maciços em infraestrutura (saneamento, transportes, eletricidade, conectividade etc.), segurança, saúde, educação, tecnologia e inovação, teremos pouca chance de aliviar efetivamente a pressão sobre a floresta.

E mais. Os esforços necessários não devem ser apenas vultosos, suficientes. Desde a aldeia até o governo federal, não podem ser desprovidos de uma lógica, de um sentido. O Brasil precisa ter um verdadeiro Plano para a Amazônia. Neste caso, “verdadeiro”, significa que deve ser implementado, deve orientar investimentos, estabelecer agendas e cronogramas, mirar resultados, identificar, prover e combinar fontes de financiamento, sejam nacionais ou internacionais. Lembremos que tivemos lá por 2003, a elaboração da Plano Amazônia Sustentável – PAS que, vimos depois, foi um plano de mentirinha, apenas para satisfazer a opinião pública, enquanto o governo estava interessado realmente era no engessamento econômico da região. Deu no que deu.


Os brasileiros que estufam o peito para falar da Amazônia enquanto apreciam a beleza do mar, precisam entender que devem a ela os melhores indicadores de desenvolvimento entre as regiões e não os piores, como vimos em todas as estatísticas. Não deixo por menos. Isto impõe também sacrifícios e espírito público de nossos políticos que, na grande maioria, olham para o próprio umbigo cada vez que alguma demanda amazônica é apresentada.


Como venho dizendo há tempos e recolho unanimemente dos especialistas participantes dos referidos “Diálogos Amazônicos” da FGV, precisamos de um plano que não seja pra governo, que seja um plano de longo prazo, que contemple toda a Amazônia, que combine os interesses do setor público, do setor privado, da sociedade e das instituições, e que transforme em realidade a narrativa dos políticos.

Infelizmente, o que vemos são naves amazônicas desconexas, ziguezagueando no tempo, ao sabor das vitórias e derrotas de grupos políticos locais, a maioria contentando-se em plantar flores, como diria o monge budista.

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